A cada edição, o Ciclo de Cinema e Psicanálise apresenta um filme contemporâneo no Auditório MIS, seguido de bate-papo mediado por Luciana Saddi, coordenadora do Programa de Cinema e Psicanálise da Diretoria de Cultura e Comunidade da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). Em seguida, o público pode participar com perguntas, integrando novas perspectivas sobre a obra discutida. A edição de novembro, com apoio da Pandora Filmes, exibe “Motel Destino”, longa dirigido pelo cineasta cearense Karim Ainouz, lançado este ano no Festival de Cannes, onde concorreu ao principal prêmio.
Após a sessão, participam da conversa a psicanalista e psicóloga Maria Luiza Ghirardi e o convidado do jornal Folha de S.Paulo Leonardo Sanchez, repórter do caderno Ilustrada.
Sobre o filme
Motel Destino
(dir. Karim Ainouz, Brasil/Alemanha/França, 2024, 115 min, 18 anos, digital)
A trama gira em torno de Heraldo (Iago Xavier), um jovem de origem humilde que chega ao Motel Destino e transforma radicalmente a vida dos que ali habitam. O motel, administrado pelo temperamental Elias (Fábio Assunção) e sua esposa Dayana (Nataly Rocha), torna-se o palco onde as crônicas da realidade brasileira se entrelaçam. Heraldo, um membro foragido de uma gangue, desperta a curiosidade de Dayana, iniciando uma perigosa dança de poder e desejo entre eles.
(Sinopse adaptada de adorocinema.com)
Sobre as convidadas
Maria Luiza Ghirardi é psicóloga e psicanalista pelo Instituto Sedes Sapientiae, onde também é docente do Curso de Psicossomática Psicanalítica. É membro filiado do Instituto Durval Marcondes da SBPSP e mestre pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP). É autora do livro “Devolução de crianças adotadas – um estudo psicanalítico”.
Leonardo Sanchez é responsável pela cobertura de cinema, televisão e streaming do caderno Ilustrada, da Folha de S.Paulo. Formado em jornalismo pela PUC-SP e com pós-graduação em mídias digitais pela ESPM, está no grupo Folha de S.Paulo desde 2015. Este ano, foi o enviado especial do jornal para a cobertura do Festival de Cannes, onde “Motel Destino” fez sua estreia mundial.
Sobre a mediadora
Luciana Saddi é psicanalista e escritora, membro efetivo e docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), mestre em psicologia pela PUC-SP e diretora de cultura e comunidade da SBPSP (2017-2020). É autora de “Educação para a morte” (Ed. Patuá), coautora dos livros “Alcoolismo – série o que fazer?” (Ed. Blucher) e “Maconha: os diversos aspectos, da história ao uso”. Além disso, Saddi é fundadora do Grupo Corpo e Cultura e coordenadora do Programa de Cinema e Psicanálise da Diretoria de Cultura e Comunidade da SBPSP em parceria com o MIS e a Folha de S.Paulo.
“Motel Destino”, por Luciana Saddi
Motel Destino, com direção de Karim Aïnouz, retrata a ambivalência típica da cultura brasileira. De um lado, a opressão patriarcal e o crime organizado; de outro, a liberdade sexual, as belezas do mar e da praia. Ambiguidade revelada nas cores do filme, que oscilam entre a clausura neon e os azuis abertos e amplos do céu e do mar.
Heraldo (Iago Xavier), jovem fugitivo marcado para morrer, se esconde no Motel Destino, acolhido por Dayana (Nataly Rocha), esposa de Elias (Fábio Assunção), proprietário do motel. A vulnerabilidade da situação de Heraldo é explorada por Elias, que se aproveita do jovem com evidente prazer. Dayana, aos poucos, se rende aos encantos de Heraldo e constrói uma aliança com o jovem, para se opor ao poder abusivo do marido.
Triângulos amorosos são fonte de inspiração para inúmeras tramas. O complexo de Édipo está no seio das triangulações amorosas. “Motel Destino” expressa a ruptura com a opressão patriarcal que sustenta a pobreza e o crime. Questiona as relações de submissão presididas pelo machismo e, principalmente, por meio do sexo, promove transgressão à ordem e ao poder instituídos.
O assassinato do pai, mito criado por Freud no livro “Totem e tabu”, reúne, a um só tempo, culpa, lei e medo de vingança, de modo a impor uma nova ordem para os filhos. A partir desse marco, não haverá mais poder ilimitado; a obediência à lei funda e caracteriza a civilização.
O roteiro de “Motel Destino” revisita o mito freudiano, mas oferece outra saída civilizatória para a situação de subordinação das personagens, que representam arquetipicamente filho e esposa. No filme, o assassinato do pai todo poderoso, que não se submete a lei, funda a autonomia das personagens e o direito de escolher os rumos da própria vida.